segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Uma aventura real

Tudo começou com um exercício na aula de estágio em Redação e Edição no laboratório universitário. Cada estudante deveria elaborar uma pauta a ser feita, porém, tínhamos a liberdade não apenas de escolher o tema, mas também a editoria e escolhi Jornalismo Literário. Imaginei uma entrevista com meu autor predileto: Carlos Drummond de Andrade. Então, entreguei ao professor. Após ler e selecionar quais entrariam naquele número, ele disse que caberia aos escolhidos fazerem a matéria sugerida.
Passado o pânico, comecei a imaginar como cumpriria a pauta que eu mesma defini. Afinal, era o ano de 1981 e ainda não dispúnhamos de Internet; mas o telefone era um meio eficiente, assim como os correios. Então, telefonei e enviei um telegrama ao autor que, alguns dias antes, afirmou em um jornal que não gostava de ser entrevistado por estudantes porque só perguntavam o óbvio.
Mesmo diante dessa afirmação, não desisti da proposta e decidi encaminhar-lhe minha proposta de pauta. Qual não foi minha surpresa, quando uma semana depois recebi um lacônico telegrama de sua filha e secretária, Maria Julieta, de que seria recebida pelo autor, às 10h, no dia 15 de agosto de 1981. 
Era uma manhã muito quente, embora ainda fosse inverno no Rio de Janeiro. Cheguei ao seu apartamento, em Copacabana e um misto de respeito, temor, surpresa e felicidade tomou conta do meu ser: era uma aventura real. Nos primeiros momentos sequer sabia o que dizer e para minha surpresa ele quebrou o gelo com um cafezinho (na época, nem gostava de café). Então, o escritor disse que havia aberto uma exceção porque ao ler a pauta percebeu que a estudante não perguntava o óbvio e, no mínimo, tinha conhecimento de causa.
Senti-me honrada e confiante, pois afinal, foi o jornalista Carlos Drummond de Andrade que sempre me fascinou, desde a adolescência, por meio da leitura obrigatória nas aulas de Língua Portuguesa, de suas crônicas e textos opinativos publicados semanalmente no Jornal do Brasil. Leituras que embalaram o sonho de ser uma jornalista profissional e, ao mesmo tempo, formaram a base para minha visão crítica de mundo. Sua prosa sempre foi tão intensa, marcante e profunda como sua poesia, mas também muito realista para alguém que começava a desvelar o mundo adulto.
Não recordo como terminou a entrevista, mas sei que durou mais do que imaginava e, ao deixar aquele prédio sentia-me a pessoa mais agraciada do mundo porque cumpri a pauta no prazo estabelecido, conheci o escritor e jornalista dos meus sonhos. Parecia viver um conto de fadas e, logicamente, escrevi de um só fôlego o texto para o jornal da Faculdade e também as minhas impressões em um de meus diários de adolescentes. Naquele dia tive a absoluta certeza de que havia escolhido a profissão certa e saberia ser uma profissional do Jornalismo fossem quais fossem as circunstâncias.
Aquele homem magro, calvo e com os óculos parecidos com os meus mostrou-me que o Jornalismo era fascinante, mas para tê-lo como profissão seria importante a persistência e a convicção de que valia a pena não desistir no meio do caminho, mantendo a ética e a dignidade, “mesmo se no meio do caminho havia uma pedra..”, como escreveu o próprio Drummond.
Além da carreira como servidor público, Drummond foi, sobretudo, um escritor e um jornalista além de seu tempo, atuando em diversos jornais consagrados como Diário de Minas, Jornal do Brasil (para o qual escreveu durante mais de duas décadas) e revistas especializadas ou não.
A riqueza de seus textos fascina crianças e jovens que têm hoje na Internet seu principal veículo de comunicação. Aliás, este mais novo veículo tem diversos sites sobre a vida e as obras do escritor, capazes de permitir a seus frequentadores conhecerem e navegarem no mundo drummondiano por horas a fio.
Portanto, a escolha do tema de abertura do blog se justifica não só do ponto de vista jornalístico, mas também por sua atualidade e minha proximidade com o escritor, favorecendo um maior deleite com sua obra. Para mim na área do jornalismo literário nada é mais apropriado, pois me permite não só estender um momento passado, mas atualizar meu tempo presente.

Regina da Luz Vieira (Regiluz)

4 comentários:

  1. Gostei da esperiência.

    Djailton

    ResponderExcluir
  2. Parabéns Re, está muito legal. Eu adoro quele texto do Carlos Drummond!!!
    Que legal que vc está querendo fazer a revolução em si mesma! Muito bom!

    ResponderExcluir
  3. Olá Regina!

    Muito bom encontrar você aqui.

    Abraços

    ResponderExcluir
  4. Olá,Tia!
    Eu tinha visto o blog e agora comento.Nossa!Eu não sabia que vc tinha entrevistado o Drummond,deve ter sido bem legal mesmo!O adoro também
    Parabéns pelos texts!
    bjs,
    Thamires.

    ResponderExcluir