segunda-feira, 28 de abril de 2014


Quando os japoneses restauram um objeto quebrado, valorizam as fraturas preenchendo-as com ouro. Eles acreditam que quando algo sofreu uma ferida e tem uma história se torna mais belo. Esta técnica é chamada "Kintsugi."

Ouro ao invés de cola. Metal precioso ao invés de substância adesiva.

E nisto está toda a diferença: ocultar a integridade perdida ou exaltar a história da recomposição?

Quem vive no Ocidente tem dificuldade de fazer as pazes com as rachaduras.

"Quebra, fratura, ferida" são vistos como o efeito mecanicista de uma culpa, porque o pensamento digital nos adestrou a percorrer sempre e somente um dos lados das bifurcações: ou algo está intacto ou está quebrado. E se está quebrado é culpa de alguém. O pensamento analógico – arcaico, mítico, simbólico, ao invés, rejeita as dicotomias e nos reporta a coexistência dos opostos, que deixam de sê-lo no fluir contínuo e osmótico da vida.

A vida é ao mesmo tempo integridade e ruptura, porque é recomposição constante e eterna. Tornar belas e preciosas as pessoas que sofreram… esta técnica se chama “amor”.

A dor faz parte da vida. Às vezes é uma grande parte, outras não, mas em ambos os casos, é uma parte de um grande quebra cabeças, da música profunda, do grande jogo. A dor faz duas coisas: te ensina, te diz que estás vivo. Depois passa e te deixa transformado. E te deixa mais sábio, às vezes. Em alguns casos, te deixa mais forte. Em todo caso, a dor deixa uma marca, e tudo aquilo que de importante pode acontecer na tua vida implicará em dor, de um modo ou de outro.

Os japoneses que inventaram o Kintsugi e compreenderam-no, mais de seis séculos atrás, recordam este fato sublinhando-o com ouro.

 


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